quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Penúltimo dia de 2010

contagem regressiva

atravesso
o medo
impreciso

domingo, 26 de dezembro de 2010

Mistérios de acalentar mãe



_ Senhora dona Sancha

feita de ouro e prata

na infância da língua

eras uma rainha



_ Que anjos me rondam?


Ando velha e medrosa

não mais toco o piano

sinfonias não componho


_ Senhora dona Sancha,

silhuetas, sombras

vestidas de branco

guardiões de vossos sonhos,

dispensamos ouro e prata

mal nunca vos faremos


_ Estou velha

bem velhinha

tenho medo de morrer


_ Medo? Pois pois,

por que medo?

por que medo?


Se no vosso coração

canta uma menina

com quem brincamos

de roda?


Dona Sancha

nossa senhora,

vos espantastes a morte

como se espanta

galinhas,

shô morte, shô



_ É verdade, é verdade,

shô morte, shô


Para os prados partirei

cavalgando meu cavalo


Sobre a cama da fazenda

me aguarda o vestido

feito na minha medida


Anjos meus

por onde andais?


Senti algum calafrio


_ Sombras vestidas de branco

somos a infância da língua

somos vossos guardiões


Vosso medo espantamos

com histórias

que contamos


_ Anjos, brancas silhuetas

segurem a minha mão

e dormirei sossegada

para acordar na fazenda

onde me aguarda azul

o vestido, nos braços

de meu namorado


Segurem a minha mão

como minha mãe segurava

quando eu ia ao dentista


Shô, morte shô

montada no meu cavalo

espanto muitas galinhas



sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A caixa dos três segundos...



... ensina a parar o mundo.
Pare três segundos antes de falar ou agir.
Se possível até de pensar.
Pare.
Aí o mundo para
e você descansa.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Tempocídio


Quando o pai não voltou nunca mais, a mãe contou à menina que ele ficou na estrada. Cresceu e passou a vida procurando o pai e salvando homens. Da estrada. Deixar de procurar o pai não fez para ela o mundo diferente.  Rasgou papel, apagou textos, pintou quadros _ nada mudava.  Matou o pai e encontrou a Morte.  Desde então, toda certeza desmatelada em poça d´agua, menos uma _ a Morte existe, e se o tempo para os mortais é curto, usá-lo mal é crime.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Indiferenças





Entre a estrada e o burgo
o viajante,
mero intervalo



terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Escrever Escrever



Cada vez menos
só quando
e se tiver
o que dizer

ATESTO



Calor verde

e pássaros

Eu, um intervalo
custo a crer,

mas o vermelho
na faixa
de concreto

as bandeirinhas
e o vento bailarino

são de verdade

terça-feira, 23 de novembro de 2010

sábado, 20 de novembro de 2010

Ou Isto ou Aquilo _ poema de Cecilia Meireles




Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo . . .
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

sábado, 6 de novembro de 2010

Viver e ser estrangeiro _ imprecisões




Albert Camus _ "O estrangeiro"
Resenha de Eliane Accioly
Edição Livros do Brasil - Lisboa.
Introdução de Jean-Paul SartreTradução de Rogério fernandes
Sem a data

Li "O Estrangeiro", de Albert Camus, da Edição Livros do Brasil/Lisboa. Tradução do Francês para o Português de Portugal. Segundo Sartre, que nesta edição tem a introdução, "foi considerado como o melhor livro desde o armistício". Ou seja, foi lançado logo após a Segunda Guerra, e fez um considerável sucesso, tornando-se um clássico da literatura. Diria eu, um dos melhores livros que cairam em minhas mãos.

A trama se passa em Argel, capital da Argélia. O narrador é Meursault, homem jovem e sem idade precisa, que vivia seu cotidiano trabalhando durante a semana entre colegas e rotinas, almoços, risadas, e uma observação acurada dos acontecimentos e das pessoas ao seu redor. Nos fins de semana fazia amor com uma mulher a quem desejava, mas não sabia se amava. Uma profunda relação com o mar e o sol, mas não parecia se ligar com sua vida. Nas situações apresentadas, tanto se lhe fazia. Era imune às expectativas dos outros acerca dele. Escapava da moralidade humana, apenas tangenciava o bom e o  mau, sem se importar ou parar para refletir. O narrador/personagem em torno do qual a trama se desenrola, de fato um estrangeiro. No namoro, trabalho, no qual se aplicava sem se ligar, amizades, escolhas _ um jeito de ser errático. Respondia: "Tanto se me dá".

O livro começa com um telegrama avisando Meursault da morte de sua mãe, e do enterro. E sem que o leitor se dê conta, a trama se desenvolve no eixo de sua relação com a mãe _ Por que a colocou num asilo? Por que não sofreu manifestamente com a morte da mãe? As pessoas se indagavam, indagações que não eram as de Meursault.
Quando vem a cometer um assassinato, a engrenagem da justiça _ advogados, juizes, promotores _ vincula o assassinato, disparatadamente, ao que lhes parecia  falta de amor filial. Concluiram em conjunto pela perversidade  e falta de humanidade do personagem. Somado a isto, Meursault não acreditava em Deus, dizia o que pensava, sem criar efeitos. Na situação de reu ão se defendia com palavras ou racicínios, usava as palavras para exprimir o que considerava verdadeiro.

Meursault é arguto e percebe sutilezas como a relação de amor e ódio de um homem com seu cão,
ou as relações ambíguas entre Raimundo, uma namorada árabe e os parentes desta mulher. O fantástico no personagem é que ele não emite juizos ou julgamentos. Sartre chama isto de "absurdo". A sensação do leitor é realmente de absurdo, tanto estamos acostumados a julgar, avaliar, pesar. E a viver em um mundo que vive de juízos e julgamentos. Diz Sartre: "O que é (...) o absurdo como estado de fato, como dado original? Nada menos que a relação do homem com o mundo". (pg 6)

O ser humano vive entre o dito e o não dito, "entre suas aspirações à unidade e o dualismo intransponível do espírito e da natureza, entre o impulso do homem em direção ao eterno (o sagrado) e o carater finito de sua existência, entre a preocupação que é sua própria essência e a inutilidade de seus esforços". (idem) O lugar do ser humano é aquele dos intervalos.

Meursault vivia sua vida, embora lhe fosse indiferente trabalhar em Argel ou em Paris, casar-se com Maria, ou uma outra mulher, embora provavelmente se casasse com Maria, pois era ela que estava com ele. Quando é preso, tem a consciência de que se um homem viver apenas um dia, poderá morrer.

Mas não é bem assim que se passa com Meursault, que se vê entre desejar viver, desejar Maria, e retomar a vida da qual nem parecia se dar tanta conta, retomar o mar e o sol.

No lugar de sair para a vida, o que não seria possível por estar prisioneiro, no fundo de sua consciência que vem despertando na prisão, prefere estar no lugar onde "caiu", do que estar do lado de lá, do lado de fora da cadeia, onde homens supostamente livres julgam e condenam outros homens à morte.

Por não ter certezas espanta-se muito com as certezas dos homens, e se pergunta como podem se confundir e criar realidades absurdas que os retiram da vida, e os fazem mortos em vida, além de se sentirem no direito sobre a vida e a morte de outros. Não pode compreender a diferença entre os que "matam" e os que "são mortos". Não queria matar _ e matou quem nada tinha a ver com ele.

No caso do crime que cometeu poderia ter sido alegada a legítima defesa. O personagem era alienado, antes de ter sido preso. Como se o crime cometido, e mais do que seu ato, as consequências do mesmo, o acordassem.

Mais do que por ter matado um homem, de uma maneira completamente estapafúrdia, no entanto, foi morto por ter sido julgado pelos seus supostos sentimentos, ou a suposta ausência desses, em relação à morte da mãe.

Acredito que temos muito a aprender com Meursault e Camus. Aprender a ser estrageiro, para escapar à perversão das certezas estabelecidas. Ser estrangeiro de certa forma pede consciência. Como estrangeiros frequentaremos os intervalos, o entre _ o único lugar que nos cabe neste latifundio que chamamos vida.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

ESPIRAIS



" (...) espiral evoluindo para o céu (o amplo) e voltando para o ser (o estreito), recriará, temática e conscientemente para alguns, mas vivencialmente para todos, o senso da vida no meio das pedras e das máquinas".

Mira Schendel

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

sábado, 2 de outubro de 2010

PARADOXO

precário
e infinito
o ser humano
pura magia

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

OS ATRAVESSADORES

Travessia, no arquipélago Fernando de Noronha, uma ilha tão pequena que poderia ser engolida por um tubarão, é a terra dos atravessadores, seres cujos corpos são feitos de fios os mais variados: alumínio, plástico, novelo de lã, arame, cobre, fios afetivos, e ainda linhas de desenhos.
Eles andam em bandos, e nunca sozinhos.
Não são seres individuais, mas coletivos.
Não há uma Carolina, mas carolinas.
E outros.
Os atravessadores se manifestam nas mais diferentes formas. Podem aparecer como humanos, animais, anjos, demônios, ou como os ETs de Varginha. Esses seres pensam, sentem, constroem mitos e filosofias, são poetas, e têm olho de recém nascido. O mundo que os cerca está pronto há milênios, mas em cada olhar, para eles, um mundo novo se revela.
Os Atravessadores surgiram primeiro em desenhos, artesanias e outras artes plásticas, as palavras e textos são posteriores.
Abaixo exibimos imagens da vida privada dos atravessadores, captadas pela câmera de um mergulhador.


Imagem publicada _
Da série: CASA de ESPELHOS

MARMOTA, a MULHER que JUNTAVA PEDAÇOS

Personagem de A CONFRARIA do LIXO.

Odim pensa em Marmota como A mulher que junta pedaços.
Olhe só como isso faz sentido: Marmota costura, junta tecidos e panos variados, prega botões e zíperes. Para o Brechó, coleta peças de vestuário: saias, blusas, vestidos, jaquetas, sapatos, bolsas, cintos, brincos, colares, pulseiras, xales, tudo o que encontra. Compra, de ricaças, seminovos em bom estado, quase de graça, e repassa, a preço módico. A vitrine do Brechó, colorida e atrativa, montada por Marmota, leva jeito de loja grã-fina: atrai, convida, sugere. Uma tentação!


quinta-feira, 30 de setembro de 2010

ABRINDO O BAÚ _ poeminha

FUNDO
O MUNDO
CARIMBA

E a LUZ
SE ILUMINA de MIM



sábado, 4 de setembro de 2010

SAMURAIS

De OS ATRAVESSADORES

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Conversar

Com algumas pessoas tenho assunto .
Com outras converso.
Conversar é mágico,
ter assunto é falar do tempo.
Aqui no blog não tenho assunto,
converso.

domingo, 15 de agosto de 2010

SERGIO FINGERMANN _ partes do todo

Eliane Accioly


Ao entrar na exposição vivi em mim o impacto provocado pelas grandes telas. Poderia chamá-las de painéis? Falo desde o lugar de aprendiz de feiticeiro, de quem recém chega ao universo da pintura. Envolvida no impacto comecei a perceber desde aí, de uma maneira vivida, o que significa o conceito de corpo do trabalho de um artista. O trabalho de SF possui corpo, consistência, materialidade viva e pulsante. Um corpo generoso que ocupa lugar e se presentifica, sem deixar de ser virtual e sutil.
Imaginei Sergio em escadas com seus pincéis e tintas, e senti a luta em pintar aquelas telas. Pensei:
Precisa de estrutura e peso da arte, essas telas não surgiram do nada. Elas se atualizaram neste momento da vida de SF, muito trabalho, pesquisa, luta corporal as antecedem.
E como em arte o passado é prospectivo, todo o trabalho de vida do SF estava naquela sala, que certamente era uma outra sala, única, ao sustentar com suas paredes aquelas telas.
Em seguida caminhei pela sala, mas cheia de pessoas, não pude contemplá-las de longe. Passeei pelos outros espaços da galeria, onde estão os trabalhos em papel e óleo. Neles pude perceber alguns dos conceitos que SF procura passar para nós, seus alunos:
1. Abandonar o traço heróico e duro, ter pulsos e mãos de pianista, no seu molejo.
2. Respirar, ter corpo, intelecto, intenção. Para ele pintura é muito menos expressão que intenção. O que começo a viver em mim. A capturar. Aprendemos por roubo e captura.
3. A imperfeição nas telas _ os traços ou a tinta que “escapam”.
4. As camadas de tempo.
5. O que não é evidente e escapa.
6. No espaço menor onde se encontram três trabalhos, um deles com a palavra ESPELHO _ vivi uma necessidade de me demorar. Estacionei no acostamento e saí da estrada. SF nos conta que a alça da estrada é o lugar do artista, fora da pista de alta velocidade. Olhei o quadro em frente à ESPELHO bem detidamente. O amarelo parecia de mentira, e era acolhedor.

Ouvi uma moça falando que as telas lhe lembravam cenários.
Uma colega de oficina falou que as telas tinham nelas o arquiteto que S também é.
Uma das telas com fundo escuro _ a cor negra construída com muitas cores abriu meu imaginário para as aulas que vivi, e para as que ainda vou viver.
E principalmente, a vivência do inacabado.

É um privilégio estar vivendo este momento que SF compartilha conosco seus alunos, e, certamente, com muitos outros. Gratidão é um sentimento delicioso, estou grata.

Sábado 14 de agosto, das 10 ;00 às 14:00horas. Período da exposição _ de 16 de agosto à 4 de setembro. Galeria DAN Rua Estados Unidos, 1638, São Paulo, SP. www.dangaleria.com.br

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Desde Cuba

Repasso reportagem/crônica do site Generation, de Yoani Sanchez.
Tenho o link, procurem "em link".

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Generación Y es un Blog inspirado en gente como yo, con nombres que comienzan o contienen una "i griega". Nacidos en la Cuba de los años 70s y los 80s, marcados por las escuelas al campo, los muñequitos rusos, las salidas ilegales y la frustración. Así que invito especialmente a Yanisleidi, Yoandri, Yusimí, Yuniesky y otros que arrastran sus "i griegas" a que me lean y me escriban.
Que me quiten de la lista »

El avión de Moratinos

moratinos-y-castro

Imagen tomada de cubamatinal.es

Mucho se especula en estos días sobre las posibles excarcelaciones de presos políticos. La prensa oficial –como siempre- adormilada entre cifras de crecimiento y viejos discursos sacados de los archivos, no confirma ni desmiente esos rumores. Una meticulosa lectura de Granma arroja que el canciller español ha venido para condenar el bloqueo, hablar del cambio climático e intentar quitar la posición común de la Unión Europea hacia el gobierno de Cuba. Si nos dejáramos llevar por lo que dicen los locutores de voz engolada y corbatas a rayas, aquí no está pasando nada… o casi nada. Pero todos sabemos que algo se mueve en la oscura zona de la diplomacia, en ese terreno de la alta política que se teje de espaldas al pueblo.

Los murmullos vienen y van. En ellos, a la palabra “liberación” se le ha ido pegando un término de connotaciones infames: “deportación”. “Saldrán directo de las prisiones hacia los aviones” me dijo un señor que se la pasa con la oreja pegada al radio, escuchando la emisora prohibida que llega desde el Norte. La expatriación forzosa, la expulsión, el exilio, han sido prácticas habituales para deshacerse de los inconformes. “Si no te gusta te vas”, te repiten desde chiquito; “arranca y lárgate”, vuelven a espetarte si insistes en quejarte; “¿para qué volviste?”, recibes como saludo si osas regresar y seguir señalando lo que no te gusta. Habilidad en librarse de los incómodos, pericia para empujar fuera de la plataforma insular a quienes se le oponen, en eso sí que son diestros nuestros gobernantes.

Tendría que ser muy grande el avión de Moratinos para poder llevarse en él a todos los que les estorban a los autoritarios del patio. Ni un Jumbo alcanzaría para trasladar a aquellos que potencialmente tienen el riesgo de ir a prisión por sus ideas y por su accionar cívico. Una verdadera línea área con vuelos semanales se necesitaría para sacar a quienes no están de acuerdo con la gestión de Raúl Castro. Pero resulta que muchos no queremos irnos. Porque la decisión de vivir aquí o allá es algo tan personal como seleccionar pareja o ponerle nombre a un hijo, no se puede permitir que tantos cubanos se encuentren entre la pared de la prisión y la espada del destierro. Es inmoral forzar a la emigración a quienes sean liberados –posiblemente- en los próximos días.

Una simple y lógica pregunta salta cuando pensamos en este tema: ¿No sería mejor que se los llevarán en ese avión a “ellos”?

PS. Comunicado del Arzobispado de La Habana aquí

sábado, 3 de julho de 2010

Os gatos da Amanda

Tanico e Pipo,
gatos
que me protegem
das estrelas

Tina, minha avó,
está com eles

Na Terra Flora
me cuida,

Olímpia,
irmã gata,
companheira de brincar

CONVALECENÇA

Ao perceber o engodo, pedi uma batida de limão para rebater a danada.

Conto:

Foi na terça feira.
Hoje, sexta, pareço a sereia de quem a bruxa roubou a voz.

A gripe se transvestiu de mulher _ loira, vestida de seda azul, sapatos dourados.

Eu lá no Largo do Arouche, a confundo com uma amiga de infância, a Regina. Nos abraçamos como se ontem. Não nos víamos há vinte anos. Regina, a furtiva, me prestou. Caminhamos entretidas de braços dados até o Viena, para tomar um chá, como antigamente.

Quando me dou conta, Regina se esvai em fumaça, deixando-me um cálice de ouro transbordante de licor de anis. A cor, o aroma. Impossível resistir, adoro licor de anis, me abri ao sabor, aroma, cor _ engoli, não como remédio, prazer cem por cento algodão.

O adoravel líquido não era anis nem licor, mas dona Gripe, engolida por mim gota a gota. Eu a otária, a crédula, enfim...

A Gripe entra, rasga-me a garganta _ suas garras venenosas no princípio nem percebidas, talvez percebidas como o toque de um amante, um tanto luxuriante.

Aí doeu. Foi quando pedi socorro à Batida de Limão, que com todo seu desejo de me socorrer, pouco fez. Não exorcizou a bruxa, pelo contrário, sentiu-se humilhada e frenética, tentando se justificar, invocando a ala das mulatas e pandeiros de escolas de samba.

Caí na cama, no lugar de cair no samba. Semana depois me reergui das cinzas, Fenix, sobrevivi.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

GREGOS






Apararam os cabelos do menino de dois anos, e no lugar da festa a tragédia: esgoelou de sufocar. Espantada a mãe viu o sangue correr dos fios cortados, e em cada fio, uma pequena serpente que, rabo de lagartixa podado, voltava a crescer. Viviam no reino de Medusa, e a família se apavorou. A deusa malévola certamente não admitiria outro igual em seu universo.

Enviado por precaução ao Templo de Apolo. Cabelos ofídicos faziam dele um ser das sombras. Protegido, porém, por Apolo, o deus solar, a aparência de malvado não desmentia seu generoso coração. Amado pelos que o cercavam. Nenhum homem, mulher ou bicho que olhasse direto sua face ou olhos jamais se petrificou, muito ao contrário, dançava como bambu. Ao crescer tornou-se namorador e fez grandes amigos, entre esses, um tal de Teseu.

Paradoxalmente, a única a se queixar dele foi Medusa. Correria o risco de provar de seu próprio veneno? Encontrá-lo a petrificaria? Ela assim acreditava. Acusava-o de roubo de direitos autorais. Pensava nele com tal arroubo odiento, que o fantasma daquele jovem povoou seus dias e suas noites, foi sua inconteste e grande paixão; sua imagem masculina e especular; seu avesso; o pior veneno de sua existência _ sempre à distância.

Nem Freud explica.

(GREGOS, de Eliane Accioly - Menção Honrosa no Concurso Mulheres Emergentes.
A psicóloga, artista plástica e escritora Eliane Accioly , foi uma das Menções Honrosas do Concurso Mulheres emergentes-de minicontos e poemas.Texto enxuto , oriundo de quem entende a mente humana - e dos deuses da mitologia, conferindo-lhe um sabor singular.

Clevane Pessoa _ jurada))

Publicado por Clevane Pessoa em:

http://www.clevanepessoa.net/blog.php?idb=23221

domingo, 27 de junho de 2010

Inumana






Entre trovões e raios
chovo andorinha

terça-feira, 22 de junho de 2010

refletindo







no espelho do sonho
fada, me vejo bruxa
bruxa, me enxergo fada

domingo, 20 de junho de 2010

Cura






Entrego-me
e na leminiscata
sou tratada

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Mínimo Conto





Sentados no silêncio meditativo, começo a bocejar.
Após a meditação as pessoas me perguntam, porque bocejei, barulhenta.
Respondo que não sabia.
Em seguida, descubro, quem bocejou não fui eu,
foi a Diana em mim, minha amiga velha de guerra, iconoclasta.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Acontece



Às vezes hoje
não é hoje,
é ontem,
ou quem sabe,
amanhã

sábado, 29 de maio de 2010



A anárquica dança
das lembranças
esvazia o passado

Todos os nomes Maria tem





Nossa Senhora do Atropelo,
livra-me do pecado
antropomórfico

Multiplica-me

domingo, 23 de maio de 2010

Diário da Av Paulista, domingo, 23 de maio



Duas velhas com bengalas. Fiquei em dúvida se seriam mãe e filha.
Minha neta garantiu que não, deveriam ser amigas. Minha dúvida permaneceu, mas entrei na de Analu, a neta de dezesseis anos. Penso ser chocante para Analu mãe e filha usarem bengalas juntas. Uma delas deveria ser bem mais moooçaaa. Enfim, oços do ofício. E aqui o ofício é a vida.

Um homem Lillás passou por nós, tomando refresco. Um homem todo lilás, roupa e sapatos Croc, lilás.

E o grupo do "Abraço de Graça", diante de nós, na frente do MASP. Éstamos em quatro. Não me atirei nos braços que me atraiam. Os companheiros (marido neto e neta) se rebelariam. Analu, minha neta, compreendeu o chamado: "As pessoas são fechadas, pedem que se abram". Analu se atirou num abraço, e eu a segui. Que maravilhoso se abrir!!!!!!!!!!!! Revolucionário. Um abraço pode ser revolucionário.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Morte e renascimento





O passado bate asas
e voa

Renasço sandálias

e penugem beija-flor

Hoje doeu



estar afastada
do mundo mágico do Cerrado,
lugar de horizonte mar,
a terra onde nasceu.

A vida doeu e ela
se sentiu esquisita

No peito a bronquite,
ninho de gato,
ronronou


Perdeu a Língua Materna
e sentiu-se analfabeta

O que a salvou de gravitar
e tornar-se
uma lua gelada,

foi o peso da gravidade,
ao jogar uma maçã em sua testa

A cabeça gemeu
mas a alma agradeceu

Hoje usou a dor
para acordar mais um pouco
da ameaça do sono
letárgico

terça-feira, 11 de maio de 2010

Um abraço aos blogueiros!



Quando menina do que mais gostava era brincar.
Continuo brincando, pintando o 7 e fazendo arte.

insônia vagabunda





o olho
na nuca

na boca afiada
uma lagartixa
bem linguaruda

a cabeça,
cabaça e cacunda

:carrega o mundo

platônico





amor, cio

andrógino

(in: "Poemas na Arena")

terça-feira, 4 de maio de 2010







terça-feira, 4 de maio de 2010


A MORTE do GATO

Enquanto o gato que me habitava morria
sete vidas espertas e bem vividas moribundas,
um espelho explode
todo um planeta

Que mais em mim quebra e se esvai?
Como ficar sem os muros
as heras e unhas de gato
as noites de cios vadios
as brigas e a malandragem
os gritos na madrugada
a travessia de rua?

Sem o vício por sardinha
sem a cumbuca florida
de entornar leite ou água?

Sem o dengo
sem a manha
o novelo arrepiado
a poltrona beije rasgada
de afiar vinte garras?

Como largar o poder
de tremelicar e correr
ratazanas e baratas?

A oitava vida parte, lunar,
em tranças pretas e prata

Nenhum príncipe para me acordar
e, também, nenhuma torre
de onde ser libertada

O poeta anuncia:

Desperta! Não morra ainda
Vidas aguardam!
A poesia, sino de bronze,
forja palavras
e acorda a cidade obscura

Morre a pena de mim:
abro cortina e persiana
com a força dançarina de mãos e braços
e felina, a isto não renuncio,
espreguiço para o Sol acolhedor

Espanto a letargia em uma cascata gelada,
coisa que gato abomina

Escovo cabelo, dentes
visto velhas pantalonas
e descalça, me preparo para rodar
outras tantas milhas
por vigílias estreitas,
escarpas não mapeadas

Viagem


Viajei incrivelmente: do presente para o passado, in loco.
Estive no ap. antigo. Não senti saudades. Não sou saudosista. É bom ou mal? Não importa. Viver sim, importa. Um lugar se aprontando para nós _ o novo espaço. Outro lugar se aprontando para outros, o velho/novo espaço. Velho para mim, novo para outro(s). A vida é misteriosa.

terça-feira, 27 de abril de 2010

imagens









chamo
e elas vêm
inesperadas

(Imagens do arquivo pessoal.
Trabalhos fotografados por
Rogério Albuquerque)

travessadores apaixonados



dançam chamando
chuva
e o divino
espírito santo

no enxame dos instantes






se carolinas e alicias
resolverem aparecer
serão bem vindas

segunda-feira, 26 de abril de 2010

DIÁRIO de DOMINGO NA AVENIDA PAULISTA




Dois homens vestidos de mulher, um jovem caipira carregando uma trouxa, uma moça vestida de menina. Os quatro, uma trupe. Pela pressa, a caminho do trabalho. Invejavelmente na deles.
Uma noiva descalça pousava para fotos.
Um hipie velho que faz e vende colares fechava a banca e corria pra não perder o futebal.
Na feirinha do MASP amigos brindavam a vida com sorriso e champanhe.
Passeata contra a vivissecção parava o trânsito e os pedestres..
Uma senhora idosa art nouveau, enorme chapéu cor-de-rosa,
e sua jovem neta, calça jeans.
Casais os mais variados, jovens de skate, crianças, gêmeos, mulheres com turbante, indianos, chineses, turistas loiros e ruivos, provavelmente de diferentes nacionalidades, nariz vermelho, câmeras fotográficas e bermudão.
Um bando alegre e falante de jovens.
Um homem solitário passeando com uma lata de cerveja.

Pequenas e abelhudas percepções.

domingo, 25 de abril de 2010

MUDANÇA

MEU NOVO ESPAÇO
A CABINE DE UM NAVIO
SINGRO O DIA
DENTRO E FORA DE CASA
FORA E DENTRO DE MIM

terça-feira, 20 de abril de 2010

DICAS


Dicas de livros que li em 2010 e que gostei muito. Daqueles que fico triste quando acabo de ler:

"A elegância do Ouriço", Barberi Muriel.
"O filho eterno", Cristovâo Tezza.
"A chave da casa", Tatiana Salen Levy.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Personagens: Os atravessadores.

Atravessadoras: estas são "as carolinas".

Blogueiros

Há dois anos jamais me imaginaria blogueira. Nem saberia o que é. Muito longe de minha realidade. E aqui estou em entuziasmo _ crescente, minguante, novo, cheio, fases da Lua. Só que aqui não-sou-de-lua, sou aprendiz. O maior prazer, o de aprendiz. A maior alegria, comunicar. Encontrar pessoas. Na verdade, dois aspectos diferentes do processo. Que nunca se pode dizer "o mesmo". Pois não é. Viva as diferenças!

Preciso/desejo ser simples, falar de um jeito que me compreendam. É o que busco há muito. Busca de não terminar.


Um grande abraço,

Eliane

Personagens



As imagens são de "Atravessadores". Personagens, possuem e contam sua (s) história (s).

OS ATRAVESSADORES

OS ATRAVESSADORES


Travessia, no arquipélago Fernando de Noronha, uma ilha tão pequena que poderia ser engolida por um tubarão, é a terra dos atravessadores, seres cujos corpos são feitos de fios os mais variados: alumínio, plástico, novelo de lã, arame, cobre, fios afetivos, e ainda linhas de desenhos.
Os atravessadores se manifestam nas mais diferentes formas. Podem aparecer como humanos, animais, anjos, demônios, ou como os Ets de Varginha. Seres que pensam, sentem, constroem mitos e filosofias, são poetas, e têm olho de recém nascido. O mundo que os cerca está pronto há milênios, mas em cada olhar, para eles, um mundo novo se revela.
Os Atravessadores surgiram de desenhos, artesanias e outras artes plásticas. As palavras e textos que os contam vieram depois.

Tuca, cadela guardiã da vida e da morte.



Pote atravessador.

sábado, 17 de abril de 2010

A marca letárgica da conversa

Olhar a tecelã
tecer
deixa-me
entre o sonho
e a vigília

Espeto o dedo
no fuso

E adormeço
cem anos

Homem nú? Homem vestido?

Encontrei meu marido no hospital, ia tirar umas pintas do rosto, uma verruga na perna. O médico atende em hospital. quando cheguei ele estava nú, só de cueca, com um avental azul de paciente pronto para a cirurgia. Não era sério, anestesia local. Estava perdido, entretanto, parecia um menino reclamando e obedecendo:

_ Coloque as "botas cirúrgicas", _ colocava, a touca, também.

Me entregaram suas roupas em uma sacola, inclusive os sapatos, e um papel onde assinou entregando os documentos, carteira e que mais.

Ri da história, imaginando se eu fosse embora com as coisas que portava: seu lenço e documentos...Não fui. Fiquei aguardando fielmente sua saída.

Nem acredito na mudança, quando de novo se vestiu, e se apossou do papel que lhe permitia resgatar lenço e documentos. De obediente passou a mandar:

_ Quero sair já daqui, tenho um compromisso às 18 horas, inadiável!!!!

A pressão dele até subiu.

Após luta paladina conseguiu a alta. Puxa!!!!!!!!!!!! Não posso me esquecer, num hospital, nús, se apossam de nós tais abjetos. É verdade, meu.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

CUIDADO COM O QUE DESEJA

Nina ganhou do pai o Angorá.
Chamou-o Reno, que sabia nome de rio.
O Rio Reno corre longe do agreste cerrado de Goiás, nos campos cultivados da Europa,
O Gato Reno, porém, passava seus dias com Nina.
Um gato engraçado, no grude com sua dona,
felino manhoso que seguia Nina, e abanava o rabo quando a avistava.

Um dia passeava com o Gato, no bosque de jatobás.
Nina apanha uma fava graúda no chão, acabada de cair do galho.
Gosta muito da fruta seca e áspera.
Abre a fava, com a ajuda de uma pedra.
Não era uma fava comum aquela, abrigava um gênio.
Aliás, o aprisionava.

O Gênio quase mata Nina de susto, aparecendo em alto estilo, provoca uma nuvem de poeira esverdeada. Ela precisou limpar-se do pó, batendo as mãos na roupa e no corpo, para enxergar aquele ser minúsculo, que em seguida lhe ordena, mais que pede:


_ Um desejo, menina, só um. E você me libertará.

A única testemunha do fato encantado, além de Nina, o Reno, macio e quente, enconstando nas pernas da dona e ronronando, como se nada acontecesse.
Em meio ao espanto Nina berra:

_ Quero o Reno comigo para sempre!

Desta vez, não foi uma nuvem de poeira, mas uma explosão de pó e faíscas verde musgo.
Nina cai sentada, tosse, espirra, e quando abre os olhos,
encontra em seus joelhos, um gato de porcelana igual ao Gato Reno.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

De mudanças e de diários

Estou mudando de casa.
Não mudei tanto assim em minha vida, mas cada mudança de casa é para mim também mudança de vida, outra etapa se inicia.
Mudanças são tempos de encontrar "coisas". E de perder muitas e muitas coisas. De se desfazer não apenas de objetos, mas de hábitos e formas de viver.

Nessa mudança encontrei diários, inclusive um de quando eu tinha 14/15/16 anos. No diário inocente, uma menina falava de fatos...
E alguns acontecimentos. Relendo-o percebi que não tinha acesso, naquela idade, aos meus sentimentos como procuro hoje. Também percebi que era muito romântica e preocupada em conhecer o amor.

A diferença entre "fato" e "acontecimento"?
O fato é descritivo, direto. Por exemplo:
"Almocei da casa de vovó Lelé; encontrei com meus amigos, andei de bicicleta".

Um acontecimento não é direto, é filtrado por percepções, sentimentos, por paradoxos. Escrever esta crônica, por exemplo, gostaria que fosse da ordem do acontecimento. Esta crônica ou qualquer outro escrito.

Aconteceu comigo agora, nessa fase, de jogar fora e me desfazer de diários e mais diários. Me desfiz deles ou porque achei a linguagem confusa, ou porque eram "diretos" demais, factuais.

Do pequeno diário vermelho de couro que mencionei acima, no entanto, não me desfiz. Ainda. Ele é resvalado por acontecimentos, e tem histórias engraçadas. E tenho agora uma neta que tem a idade que eu tinha no tempo do diário. Resolvi que vou mostrá-lo a ela, que é muito curiosa de como eu era quando jovezinha. Isso transforma aquele diário em um acontecimento? Acredito que sim. Um encontro entre o passado e o presente, revelando uma jovem que hoje é avó.